sexta-feira, 19 de novembro de 2010

O peregrino e sua cadência

























Ok, talvez não seja perda de tempo escrever algumas considerações sobre peregrinos em uma madrugada qualquer. O próprio assunto já evita o tempo dispendido ser uma perda. Uma peregrina cristã comentou, durante essa semana, sobre o andar de um peregrino ser sempre cadenciado. Isso é muito curioso. Não importando se a caminhada é em volta do monte Kailash, saindo da tour Saint-Jacques ou chegando na nascente do Ganges, o ritmo é sempre cadenciado.

Não se trata de dizer que o ritmo cadenciado imitaria qualquer ordem do mundo, por ser invariável nos peregrinos. O que parece insistir em cada um deles não é propriamente a cadência, mas aquilo a que a cadência responde: quando o peregrino faz sua grande caminhada, é como se uma complexa atitude espiritual se desenvolvesse.

Em primeiro lugar, tal atitude envolve uma abertura do peregrino ao mundo circundante e seus acontecimentos. O abandono do lar desfaz as proximidades e abre o peregrino à novidade. Durante a jornada o mundo ao redor, não mais cotidiano, recebe um ingrediente religioso, sagrado. A relação com o mundo deixa de ser a da cotidianidade desatenta para adquirir importância em cada gesto.

O próprio cotidiano se reveste de um caráter sagrado. Ocorre uma rara ocasião na qual o sagrado se reúne com os acontecimentos fortuitos do mundo.

Sem contar a abertura do peregrino aos outros e os ritos de hospitalidade. As pessoas do caminho tornam-se mais propensas à recepção, aos velhos ritos de hospedagem. O peregrino também não se vê apenas como um visitante. As relações com o anfitrião e os outros desenvolvem uma intensidade também incomum, se comparada à vida cotidiana. Relações de amizade se estabelecem sem mediações habituais; compromissos também se fazem e se desfazem harmoniosamente.

No caminhar, enquanto se aproxima de seu objetivo, o peregrino muda também a si mesmo. Torna-se outro, diferente do que saiu. Desenvolve outras relações com o mundo, com o outro e consigo.

A atitude espiritual do peregrino é de aprendizagem. Uma notável aprendizagem que não separa a espiritualidade do mundo e dos valores de cada ação. Nesse sentido, a persistência do caminhar, sua cadência, no fim das contas se transporta para a vida cotidiana depois da peregrinação. Se um dia o peregrino aprender bem, sentirá na alma aquilo que cognitivamente já sabe: que sua própria vida é peregrinação.

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quarta-feira, 11 de agosto de 2010

O que vale a minha vida?

Pintura: Luiz Badosa


O que vale a minha vida? No fim (não sei que fim)
Um diz: ganhei trezentos contos,
Outro diz: tive três mil dias de glória,
Outro diz: estive bem com a minha consciência e isso é bastante...
E eu, se lá aparecerem e me perguntarem o que fiz,
Direi: olhei para as cousas e mais nada.
E por isso trago aqui o Universo dentro da algibeira.
E se Deus me perguntar: e o que viste tu nas cousas?
Respondo: apenas as cousas...Tu não puseste lá mais nada.
E Deus, que é da mesma opinião, fará de mim uma nova espécie de santo.

Alberto Caeiro, in: Poemas inconjuntos.
Fonte: Primeiros Escritos

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sexta-feira, 23 de julho de 2010

Le Rêve de Saint Aubert



« On s’est longtemps demandé si, vers les sixième et septième siècles, les monts Tombe et Tombelaine se trouvaient au cœur d’une forêt, dite forêt de Scissy, qu’un raz-de-marée aurait engloutie par la suite, ou s’il s’agissait déjà d’îlots ponctuant la Baie comme on le pense aujourd’hui, la forêt renvoyée aux légendes. En tout cas, sur ces monticules arides, isolés et déserts, on est porté à croire que, comme à l’origine de la création, seul planait d’abord l’esprit de Dieu, jusqu’à ce que, vers l’an 600 - pourquoi telle année ou tel siècle plutôt que d’autres, au cours du temps ? - quelques ermites vinssent trouver dans ce bout-du-monde de quoi répondre à leur besoin d’absolu, lointains successeurs des cultes druidiques, et qui y sacrifiaient peut-être encore. Et c’est ainsi que le mont Tombe s’éveilla à la vie des hommes. Et qu’à l’immobilité, succédèrent les premiers mouvements.

Puis un manuscrit du neuvième siècle nous apprend qu’en l’an 708 (certains précisent même : le 16 octobre) Aubert, évêque d’Avranches, rêva. Il connaissait nécessairement ces lieux, puisqu’ils appartenaient à son diocèse, et peut-être allait-il, de temps en temps, chercher auprès des saints ermites quelque réconfort s’il souffrait, s’il connaissait des tourments, quelque lumière, s’il se trouvait l’âme obscure, quelques témoignages de foi, si le doute l’avait pris. Or on ne peut, me semble-t-il, fréquenter de tels lieux et les étranges solitaires qui les habitent, et s’y mettre soi-même à l’épreuve, fût-ce de manière occasionnelle, sans qu’ils s’incrustent en vous, qu’ils vous pénètrent, et qu’ils finissent par se faire l’image, le reflet à la fois de vos peurs et de vos espoirs.

Il rêvait donc. Comment ne pas rêver, en effet, lorsque l’on est de plus en plus attiré par la rigueur de ces lieux sauvages ? Il rêvait. Qu’attendait-il ? L’homme se rêve. Et, rêvant, se transforme. Au long du temps, ses rêves le façonnent. Quels rêves allaient-ils donc le façonner ? Quelles figures, quelles visions allaient-elles surgir de la nuit ? Quelles angoisses allait-il endurer ? Quelles peurs allait-il devoir vaincre ? On n’est jamais le maître de ce qui vous parcourt, de jour comme de nuit. Certains de ses rêves devaient donc l’inquiéter, certains autres le rassurer, les uns et les autres peut-être se contredire. Et parce que ces différentes tensions trouvaient en lui un terrain favorable, il subissait, il espérait, il craignait, il attendait, tiraillé entre ces forces antagonistes, comme s’il avait été l’enjeu de quelque combat céleste.

Puis ce fut, peut-on dire, l’irruption de l’archange. Alors, tout à coup, finies les interrogations, les incertitudes, les perplexités. La destinée d’Aubert bascule lorsque saint Michel lui demande de lui dédier le mont Tombe et d’y bâtir un sanctuaire en son honneur. Vous le voyez : il se réveille, probablement en sursaut. Il a, quelques instants, la tête vide, le temps de revenir à la réalité, de reprendre ses esprits. Puis, comme un éclair, le rêve qu’il vient de faire l’envahit. L’archange ! Que lui arrivait-il ? Dormait-il encore ou rêvait-il éveillé ? Comprenait-il le sens du message ? Et n’était-il pas porté, dans son désarroi, à confondre nuit et jour, veille ou sommeil, rêve - illusion - ou réalité ? »


www.lekti-ecriture.com/editeurs/Au-Mont-Saint-Michel-le-r...

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quarta-feira, 30 de junho de 2010

Seamus Murphy: Shambhala





My 3,400 mile journey across the vast Tibetan Plateau included the pilgrimage around Mount Kailash, tangles with Chinese troops on seldom-seen corners of the Tibetan roof of the world and, following clues gleaned from ancient guide books, ended in the Muslim deserts of Central Asia. I may or may not have reached Shambhala, but I glimpsed a world of disappearing cultures and threatened beliefs. Shambhala is the story human beings need to tell themselves: that beyond this world, there is another, a paradise of eternal life and the restoration of hope. [source]

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quinta-feira, 6 de maio de 2010

A estrada adiante


A estrada adiante


Meu Senhor Deus, não tenho idéia de para onde estou indo.
Eu não vejo a estrada diante de mim.
Não tenho certeza de onde ela terminará.
Tampouco realmente conheço a mim mesmo,
e o fato de pensar seguir tua vontade
não significa que eu efetivamente o faça.
Mas acredito que o desejo de agradá-lo
de fato o agrada. E espero ter esse desejo em cada ação.
Espero nunca fazer nada à parte desse desejo.
E sei que se eu agir assim
você me conduzirá pela estrada correta
embora eu possa nada saber a esse respeito.
Portanto confiarei em você sempre
embora eu possa estar perdido e nas sombras da morte.
Não temerei, pois você está sempre comigo,
e nunca me deixará sozinho face aos perigos.


- Thomas Merton -
(tradução: Pensamento Peregrino)

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quinta-feira, 22 de abril de 2010

The Road Ahead

The Road Ahead

My Lord God, I have no idea where I am going.
I do not see the road ahead of me.
I cannot know for certain where it will end.
Nor do I really know myself,
and the fact that I think that I am following your will
does not mean that I am actually doing so.
But I believe that the desire to please you
does in fact please you. And I hope I have that desire in all that I am doing.
I hope that I will never do anything apart from that desire.
And I know that if I do this
you will lead me by the right road
though I may know nothing about it. Therefore will I trust you always
though I may seem to be lost and in the shadow of death.
I will not fear, for you are ever with me,
and you will never leave me to face my perils alone.


- Thomas Merton -

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sexta-feira, 26 de março de 2010

Grigori Perelman e Lady Gaga


EM 2008, quando Lady Gaga gravou seu primeiro álbum, já se tinham passados seis anos do dia em que Grigori Perelman resolvera a Conjectura de Poincaré, um dos maiores mistérios da matemática. Num mundo que consome celebridades, a história de Perelman merece cinco minutos de atenção.

Ele é um matemático russo, de 43 anos, já passou meses sem trocar de roupa, raramente corta as unhas, a barba ou o cabelo. Vive com a mãe em São Petersburgo, tem horror a jornalistas e viveu sete anos praticamente recluso. Nem e-mails respondia. Quando esteve nos Estados Unidos, a base de sua alimentação era pão preto e iogurte. Recusou cátedras nas universidades de Princeton, Berkeley, Stanford e no MIT. É um excêntrico, mas é um excêntrico que tem bastante a ensinar. Até que ponto vive-se melhor parecendo maluco do que deixando-se bafejar pela celebridade?

Superando ciúmes, intrigas e rivalidades, Perelman acaba de conquistar o prêmio dos "Problemas do Milênio", com direito a um cheque de US$ 1 milhão, concedido por uma fundação americana, por ter decifrado um dos sete grandes mistérios da matemática. Em 2006, ofereceram-lhe um honraria considerada equivalente a um Nobel de matemática. Recusou-a.

Para os leigos (como o signatário), a Conjectura de Poincaré é algo incompreensível. Ainda assim, pode-se perceber que Poincaré, um matemático francês que morreu em 1912, deixou para o mundo uma conjectura. Mais difícil será entender o que significa o segundo mistério: "A existência de Yang-Mills e a falha na massa".

Perelman resolveu a conjectura em 2002. Em vez de mandar seu trabalho para uma revista científica, onde um painel de estudiosos estudaria a consistência dos argumentos, simplesmente jogou os textos na internet, num arquivo público de trabalhos acadêmicos. O trabalho não dizia que a conjectura havia sido resolvida, essa tarefa cabia a quem o lesse. (Um matemático gastou três meses para entendê-lo.) A comunidade dos sábios consumiu dois anos estudando, invejando e, em alguns casos, buscando uma falha na explicação. Perda de tempo.

Quando Perelman foi convidado por Princeton, pediram-lhe um currículo. Respondeu que, se não sabiam quem ele era, não deveriam convidá-lo. Como o MIT chamou-o depois que resolveu a Conjectura de Poincaré, recusou porque deveriam tê-lo chamado antes. Num último convite podia ganhar quanto quisesse e fazer o que quisesse durante o tempo que bem entendesse. Respondeu que estava comprometido com seus alunos do ensino médio de São Petersburgo, o que nem era verdade.

Perelman ofendeu-se quando o "New York Times" disse que ele sustentava que resolvera a conjectura para ganhar US$ 1 milhão. Afinal, estudava o problema muito antes de o prêmio surgir e não sustentava coisa alguma. Decifrara a Conjectura de Poincaré, ponto.

Perelman é um matemático excêntrico e, pensando-se bem, Lady Gaga é uma roqueira quase convencional. Assim as coisas ficam fáceis e pode-se ir em paz ao próximo show. Contudo o mundo fica mais interessante quando se sabe que o negócio de Perelman é outro. Os matemáticos podem viver num mundo de liberdade e rigor absolutos. Ele escolheu uma vida de total integridade, sem concessões a coisa alguma. Ninguém manda nele, só a matemática, num diálogo que dispensa outras vozes.

Elio Gaspari

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